As ondas de choque da final deste sábado do Festival Eurovisão da Canção ainda estão bem latentes e o caos da edição mais politizada de sempre teve impacto na atuação portuguesa, com o vídeo de “Grito” a ser publicado no site e no YouTube do evento já bem perto do encerramento das votações.
Agora, a RTP quer explicações “cabais” da União Europeia de Radiodifusão (na sigla em inglês, EBU – “European Broadcast Union”) sobre o atraso na publicação do vídeo e a estação pública vai analisar o que aconteceu nesta edição do Eurofestival, desde a alegada intimidação da comitiva israelita à votação do público na canção de Israel.
“Ah! Mas a vossa concorrente tem motivos pró-Palestina pintados nas unhas” – elemento da organização
Iolanda cantou o tema “Grito” e muitos aguardavam pela partilha do tema por parte da EBU. Mas a entidade trocou as voltas: nas redes sociais, foi publicado um excerto da atuação na primeira semi-final; no site, publicou as fotos desse momento e no YouTube, o envio não foi efetuado em tempo útil, tendo a organização saltado para a atuação seguinte.
O vídeo lá acabou por ser divulgado, mas quase no final do período de votações.
O que terá atrasado esta divulgação? Em declarações na emissão “3 às 15” da RTP3, o presidente do Conselho de Administração da estação pública Nicolau Santos afirmou que a RTP não tem, até ao momento, “evidência de que o atraso na entrada do vídeo tenha tido a ver com qualquer motivo relativamente à forma como a Iolanda se apresentou em palco”.
A cantora apresentou-se com as unhas pintadas com motivos pró-Palestina e essa questão foi levantada numa troca de emails entre a delegação portuguesa e a organização do festival. Quando percebeu que o vídeo da atuação ainda não tinha publicado, tal como os de outras atuações, ou seja, logo após a sua apresentação em palco, a delegação portuguesa entrou em contacto com a organização do festival. Inicialmente, alegou-se haver um problema técnico, mas logo elencaram outra questão: “É nessa troca de emails que a pessoa que está a responder à nossa delegação disse: ‘Ah! Mas a vossa concorrente tem motivos pró-Palestina pintados nas unhas’. E houve da nossa parte a pergunta ‘Sim, mas o que é que isso tem a ver? Qual é o problema que daí resulta?’ e o que aconteceu é que, imediatamente a seguir, o vídeo entrou”, refere Santos.
A troca de emails terá durado cerca de “meia-hora”, segundo o responsável, sendo que agora, a RTP quer respostas: “Estamos à espera de saber explicações mais cabais“, assegura.
E um protesto formal? O presidente do Conselho de Administração não descarta essa hipótese, mas é preciso ter calma: “Temos de ter consolidadas as indicações do que se passou e se, efetivamente, houve um problema técnico ou se foi alguém que estava na régie que, propositadamente, atrasou a entrada do vídeo no ar“.
“Este festival merece uma reflexão” – Nicolau Santos
A questão israelita foi também abordada nesta intervenção no canal público de notícias. Quando questionado sobre a alegada intimidação por parte da comitiva israelita para com outras comitivas, Nicolau Santos remeteu para uma reunião com a delegação portuguesa: “Na terça-feira, em Lisboa, vamos ter uma reunião para analisar, com as pessoas que estiveram em Malmö, os factos que pensamos que devem ser corrigidos e debatidos a nível da Eurovisão, precisamente para evitar que eles se voltem a repetir”, diz o responsável, acrescentando que “este festival merece uma reflexão pela forma como decorreu e pelo vários factos que ocorreram“. O festival foi alvo de várias manifestações, dentro e fora da Malmö Arena, devido à presença de Israel, mas também devido ao afastamento do concorrente dos Países Baixos.
E foi justamente este país que conseguiu “uma votação verdadeiramente extraordinária” por parte do voto do público. Santos vai mais longe: “Para um evento que não se quer político, é óbvio que temos de refletir sobre esta votação, que foi uma votação política de pessoas que apoiam Israel e que levaram Israel para este nível de classificação”. Recorde-se que a própria votação do televoto português deu 12 pontos a Israel.
Sair da Eurovisão não está, no entanto, em cima da mesa: “A nossa participação junto da Eurovisão vai muito para lá deste evento, nomeadamente em matéria de formação, de apoio técnico, de recursos, etc., portanto, não faz grande sentido Portugal estar a equacionar sair da Eurovisão”, indicou o dirigente, mas acrescentou que ainda não havia “nenhuma decisão em não participar neste concurso“.
A edição 2024 do Festival Eurovisão da Canção foi ganha pela Suíça, que recebeu 591 pontos. Portugal ficou em décimo lugar.