Conhecimento desigual da biodiversidade leva a preferirmos as espécies carismáticas

Investigadores concluíram que os organismos preferidos da ciência e da sociedade são os que nos são úteis ou prejudiciais, que estão ameaçados e que têm nome comum. Espécies-chave estão fora deste “radar”.
Universidade do Minho

“O nosso conhecimento sobre a biodiversidade é desigual, pois valorizamos espécies que nos são úteis ou prejudiciais, que estão listadas como ameaçadas e que têm um nome comum. Esta disparidade influencia as decisões políticas, como priorizar o estudo e a conservação de espécies carismáticas, e também a nossa compreensão da vida na Terra”. O alerta é de Ronaldo Sousa, do Centro de Biologia Molecular e Ambiental (CBMA) da Escola de Ciências da Universidade do Minho, num artigo agora publicado na conceituada revista “eLife” com autores de oito países.

O trabalho fez uma seleção aleatória de 3019 espécies de 29 divisões/filos da chamada árvore da vida. Cada uma das espécies foi caracterizada pelo seu interesse científico (número de publicações científicas por espécie) e pelo seu interesse social (visualizações na Wikipedia por espécie). Depois, relacionou esses dados com fatores morfológicos (tamanho, cor), ecológicos (distribuição, singularidade, habitat) e socioculturais (espécie ameaçada, de nome comum, perigosa ou usada por humanos) dessas mesmas 3019 espécies.

A equipa concluiu que os organismos preferidos da ciência e da sociedade são os que nos são úteis ou prejudiciais, que estão ameaçados e que têm nome comum. Destacam-se também as espécies maiores, com distribuições geográficas mais amplas e taxonomicamente únicas. Já as espécies coloridas e evolutivamente mais próximas dos humanos também captam muita atenção da sociedade em geral, embora no volume de publicações científicas isso não seja tão evidente.

Espécies-chave fora do radar

“Estas prioridades sociais e científicas não são casuais, logo poderemos estar a ignorar espécies-chave no estudo e na conservação apenas por não estarem no nosso radar cultural”, diz Ronaldo Sousa. Os resultados destacam um claro favoritismo em relação a determinados ramos da árvore da vida, sobretudo da divisão dos cordados, que inclui os mamíferos, aves, répteis, anfíbios e peixes. Mas desta divisão fazem parte pouco mais de 80 mil espécies, sendo que no planeta há 2.5 milhões de espécies descritas, sobretudo invertebrados como insetos, crustáceos, nemátodes e moluscos, entre outros.

“Ligamo-nos desde os primórdios com a vida selvagem, que faz parte dos nossos rituais, das nossas artes e que é fonte de alimento e materiais, mas na verdade temos menos conhecimento e interesse sobre boa parte das espécies que nos rodeiam”, realça. O biólogo da Universidade do Minho sugere assim uma aposta clara na consciencialização política, educativa e cultural sobre a biodiversidade, numa fase de desafios globais como o desenvolvimento sustentável e as alterações climáticas.


Este texto é publicado n‘o largo. no âmbito do projeto “Cultura, Ciência e Tecnologia na Imprensa”, promovido pela Associação Portuguesa de Imprensa. 

Encontrou um erro ou um lapso no artigo? Diga-nos: selecione o erro e faça Ctrl+Enter.

Total
0
Partilhas
Artigo anterior

"Chocolate Market" está de regresso

Artigo seguinte

“Carros elétricos não são a solução para a transição energética”, diz investigador

Há muito mais para ler...
Ler +

Clima: Como é que os residentes de regiões costeiras lidam com a subida do nível do mar?

"A vinculação ao lugar é a ligação afetiva das pessoas a um determinado lugar, bairro, comunidade ou cidade, e está relacionado com o desejo de permanecer perto dessa área devido ao sentimento de segurança e confiança", referem as investigadoras sobre o conceito do estudo.

Spelling error report

The following text will be sent to our editors: