A 30 de Junho, o Conselho Superior de Rádio e Televisão da Turquia (RTÜK) – o principal regulador dos meios de comunicação social [NT: o equivalente português à Entidade Reguladora para a Comunicação Social] – bloqueou o acesso aos sites em língua turca da Deutsche Welle (DW) e da Voice of America (VoA) depois dos dois meios de comunicação se terem recusado a obter uma licença de radiodifusão. A decisão vem alguns meses depois da entidade ter anunciado que iria tentar obter uma ordem judicial para bloquear o acesso aos serviços em língua turca da DW, VoA e Euronews, depois dos três órgãos de comunicação social se recusarem a solicitar uma licença de radiodifusão no período de 72 horas que o regulador concedeu em fevereiro de 2022. Em abril, após a Euronews ter feito ajustes no seu site, a RTÜK retirou o pedido para o canal pan-europeu de notícias.
Nos últimos anos, foram concedidos poderes abrangentes à RTÜK para controlar o conteúdo dos meios de comunicação social online. A mudança não foi anormal, visto que mais de 90 por cento dos meios de comunicação social tradicionais são propriedade de empresas pró-governamentais.
Yaman Akdeniz, professor de direito online na Universidade de Istambul Bilgi, descreveu a decisão como “censura” numa série de publicações no Twitter que anunciavam a decisão do tribunal:
Como é que a Turquia chegou aqui?
Em fevereiro, a VoA e a DW anunciaram a sua decisão de não cumprirem os Regulamentos da RTÜK.
Na sua declaração, a Voice of America considerou que “o licenciamento é a norma para a radiodifusão sonora e televisiva, porque o espetro de emissão é um recurso público finito e os governos têm a responsabilidade reconhecida de regular o espetro para garantir a sua utilização no interesse do público. A Internet, pelo contrário, não é um recurso limitado e o único objetivo possível de uma exigência de licenciamento para distribuição na Internet é permitir a censura“, frisou.
A declaração de DW ecoou o mesmo sentimento: “Depois de ter submetido os meios de comunicação social locais na Turquia a tal regulamentação, agora está a ser feita uma tentativa de restringir a cobertura dos serviços de comunicação social internacionais. Esta medida não está relacionada com aspetos formais da radiodifusão, mas sim com o próprio conteúdo jornalístico. Dá às autoridades turcas a opção de bloquear todo o serviço com base em reportagens individuais e críticas, a menos que essas reportagens sejam eliminadas. Isto abriria a possibilidade de censura. Recorreremos contra esta decisão e intentaremos uma ação judicial nos tribunais turcos”.
O aviso emitido em fevereiro baseou-se num regulamento que entrou em vigor em agosto de 2019, quando o Estado turco concedeu à RTÜK poderes para monitorizar as transmissões online (desde plataformas on-demand, como a Netflix, a emissões regulares e/ou programadas online e produtores de conteúdo em vídeo domésticos), obrigando as entidades online a obterem uma licença da RTÜK.
Em abril, Okan Konuralp, membro do Conselho da RTÜK, em entrevista à Bianet [NT: agência de notícias turca], disse que o conselho pode bloquear o acesso à DW e VoA “se o Tribunal Penal de Paz de Ancara aprovar o pedido de RTÜK”. A 30 de junho, o tribunal pronunciou-se a favor da proibição de acesso. Esta é a primeira vez que os poderes da RTÜK foram utilizados para bloquear notícias online, disse Can Guleryuzlu, presidente da Associação de Jornalistas Progresistas, numa entrevista à VoA.
Em resposta ao bloqueio, numa entrevista ao Financial Times, o diretor da DW Peter Limbourg disse que “a DW tomará medidas legais contra o banimento”. Limbourg acrescentou que, nas conversações da DW com o regulador, a plataforma de media tentou explicar “porque é que não conseguiu cumprir o pedido para obter uma licença, incluindo o facto dos media licenciados na Turquia serem obrigados a eliminar conteúdos que o regulador considere inadequados”. A DW está agora totalmente bloqueada na Turquia, incluindo o seu site internacional.
Entretanto, a VoA Turco partilhou no Twitter como contornar o bloqueio usando os programas “Psiphon” e “nthLink”:
As emendas legislativas abrangentes às leis nacionais, assim como o controlo institucional exaustivo por instituições governamentais como a RTÜK, criaram um ambiente de censura digital ilimitada, num país descrito pelo Comité para a Proteção dos Jornalistas como o sexto maior carcereiro de jornalistas, de acordo com o relatório anual da organização do ano passado. No outono, o parlamento iniciará também as discussões sobre o projeto de lei dos media, apelidado de “lei da censura” pelos críticos do governo no poder.
Este artigo, escrito por Arzu Geybullayeva, foi originalmente publicado no site Global Voices Online e republicado em português de Portugal n’o largo ao abrigo da licença Creative Commons CC BY 3.0.